terça-feira, 30 de junho de 2009
Crónica 1, Dia 0
Esqueci o passado. Destruí o que era para renascer das minhas contradições. Passei a ter uma existência própria.
Mas como o mundo nunca vê as transformações até estas estarem concluídas, não viu a existência que passei a ter. Porque esta existência era só minha. Fiquei sozinho. E assim passei a ser singular.
Depois de morto, passei a viver. E quando fiquei sozinho, apareceram os outros que também tinham ficado. E não tendo mais anonimato, anódinos nos tornámos. Quando tudo deixou de existir, passámos a existir somente nós. Um mundo próprio, habitado por mortos. E os mortos não têm vontade. Já nada têm a esperar. Quem não espera, não questiona. Só assim a sociedade proporciona aos seus vivos, aquela vida de mortos.
Os mortos vivos, viciosos e arrogantes.
Estou a ralar-me, tão especial coisa é, que nem bem sei que estou sentindo. Reasseguro-me por mim só.
É estranho como mova a minha vida em dias, para não ficar intoxicado com as horas.
Prefiro assim.
Conhecer é pior. É dar importância ás coisas. E eu não quero ser importante. Não quero pretensões, só quero estar, e para isso tenho de ser despretensioso. Prefiro o anonimato.
Quero permanecer na ignorância.
Não quero dar e para tal aceito não ter de receber.
Não quero alucinações paranóicas de pecados que não cometi.
Ao viver todos os dias, não sou bonito nem feio. A solidão ensinou-me a comer peixe á 6ª feira. Não quero deixar de o fazer, porque não quero pensar no que fazer em alternativa. Não me interessa conhecer, para a seguir deixar de existir. Quero um expoente camuflado de vertigem. Quero existir somente, sem sequer compreender o que faço.
Todas as horas permanecem ridículas até serem nossas.
A indiferença é maior verdade da natureza.
Soam-me aos ouvidos, relatos de profetas.
Se não estivesse demasiado cansado de pensar, até escolhia agora um projecto de vida.
A qualquer hora, em qualquer lugar, não interessa onde, em todo o lado, sei que estou lá. Não adiante disfarçar. Pulsa-me nos ouvidos. Toca-me nos dedos. Dá vida a tudo o que mexe. A tudo o que vem, a tudo o que vai. Toda a gente o sabia, toda a gente o sabe. Amo-te. És o expoente dos meus sentidos, das minhas emoções. És a razão do meu ser, por seres a razão do meu sentir. Porque vivo o que sou, sou o que sinto, e o que sinto, é que consigo ser em ti.
Mudanças
É a mesma coisa sempre que nos apaixonamos. Fico sempre diminuído perante a possibilidade de me poder apaixonar. Não o faço muita vez. Acho sempre que não vou aguentar. Tudo tem o seu tempo. E eu não fui feito para suportar o tempo dos outros.
Constróem-se casas só para se ter um sítio para ficar. Já não consigo apaixonar-me pela terra. As transformações deixam-me como um clandestino, à beira de se tornar náufrago, com tudo a acontecer ao mesmo tempo, sem forças para dizer basta, que é esta a última vez.
Pequeno, sinto-me aconchegado. Tenho tendência para me enroscar sobre mim próprio. Já o vi acontecer muitas vezes. E sempre que levanto a cabeça, perco o contacto com o pulso, que sem pensamento, entra em hibernação. Digo o que tenho e não com o que fiquei. Porque quero acreditar que estão a acontecer mudanças. Os lugares mudam muito. O tempo faz o mesmo.
Eu é que não quero apaixonar-me pelo tempo.
Ao desejar, a propriedade passa a ser tudo.
Só que eu não quero ter nada.
Não quero responsabilidades com a posse.
Tudo estaria certo se as metáforas fossem filhas do desejo.
- À quanto tempo não te via!!!
A gente vai e vem.
Mas uma voz chama-me sempre de volta. Faz-me sentir pequeno. Vejo-o nitidamente.
Vou-me embora, quero ir correr. Não me interessam as mudanças, porque as evito à força de as ter. Estou farto de estar em mim. Um destes dias, escapo-me para fora do mundo. Isso sim, é que seria uma mudança.
Aqui, tudo vai sempre ser igual.
Luzes
Já se aperceberam, por certo, que ninguém consegue ver para dentro de ninguém. Vocês já se aperceberam que estão do lado que consegue ver? Só me dirijo a vocês nestes modos, porque consigo ver dentro de mim o que os outros não vêem. Vocês são os outros, aqueles que não conseguem ver.
Não sei o que vocês entendem por vida. Para mim, é mais que um simples rosto. É desejo de ter.
É fazer o que tenho a fazer, sozinho de um lado, até me entronizar como real. Preciso disso mais do que qualquer outra coisa. Diz-me que posso ser aquilo que quiser. Sozinho, a vontade deixa-me feliz.
Será que é isto ser real?
Alguém mais consegue ver esta luz?
Já alguém percebeu de que lado é que está a visão de nós?
Já alguém percebeu que essa é a única força que se pode ter?
A subjectividade é genérica. A natureza é a verdade do subconsciente. A verdade não tem complexos, porque a mentira precisa de o ser. E sem mentira, não há verdade.
Que interessa se o passado corta ou não connosco? Já tenho de imbecil, tudo o que devia ter. Para uma coisa existir é preciso o oposto da mesma. As coisas são complexas. Definem-se umas nas outras através da comparação. Não saber isso, seria não querer ver a luz, que é a única entidade absoluta.
Mas será que alguém quer ver a luz?
Já deixei de querer ser forte, para assim o passar a ser. Só não pensando é que as coisas passam ao subconsciente. Só aí há natureza. Só aí há verdade. Será que mais ninguém consegue ver a luz?
A razão
... Um piano entrou, lento...prolongado...pingado...Não estava só, aquele som...
... Outro se lamentava, melancolicamente, consolando-se mutuamente. Fiquei sentado, a escutar, em silêncio, a escutar o incestuoso som de dois instrumentos que se amavam como irmãos.
Fiquei sentado naquele banco, encostado à parede, a ouvir aqueles dois instrumentos copularem meticulosamente ao entardecer, gerando um prodígio que me fez sorrir. Afinal era possível, sorrir.
Como se nada mais fosse que uma simples conversa, gémea no tempo e espaço, um som secundava o outro, interrompia-o, respeitava-o, preenchia-o. Nada parecia mais justo, nada parecia mais certo. Naquele instante, apaixonei-me pela arte. E nesse momento, talvez mesmo somente nesse único momento, senti que a razão de ser, tinha acabado de se revelar.
Sempre me senti um esteta, que ama as coisas belas do mundo. Amo os corpos que me despertam pensamentos grandiosos e sentimentos empolgantes. Na minha intimidade, sou um purista, que vive na simbiose de todas as contradições. E nesta simbiose, dei à luz a razão como a criação pura, ausente de regras que não as assumidas.
Como tantos outros saturo na realidade a perplexidade que me puxa para fora daqui, num apelo à preservação da fuga, da fuga da dor, do medo, não da solidão, mas do desconforto, daquele que se agarra ao meu íntimo, incapaz de me deixar saborear a paixão lenta que deveria envolver-me todos os dias. A minha viagem é como a de um homem que procura compreender esse incómodo aparentemente sem razão.
segunda-feira, 29 de junho de 2009
"Garganta", by Ana Carolina
Minha garganta estranha quando não te vejo
Me vem um desejo doido de gritar
Minha garganta arranha a tinta e os azulejos
Do teu quarto, da cozinha, da sala de estar
Minha garganta arranha a tinta e os azulejos
Do teu quarto, da cozinha, da sala de estar
Venho madrugada perturbar teu sono
Como um cão sem dono me ponho a ladrar
Atravesso o travesseiro, te reviro pelo avesso
Tua cabeça enlouqueço, faço ela rodar
Atravesso o travesseiro, te reviro pelo avesso
Tua cabeça enlouqueço, faço ela rodar
Sei que não sou santa, vezes vou na cara dura,
Vezes ajo com candura pra te conquistar
Mas não sou beata, me criei na rua
E não mudo minha postura só pra te agradar
Mas não sou beata, me criei na rua
E não mudo minha postura só pra te agradar
Vim parar nessa cidade por força da circunstância
Sou assim desde criança, me criei meio sem lar
Aprendi a me virar sozinha
E se eu tô te dando linha é pra
comer você
Aprendi a me virar sozinha
E se eu tô te dando linha é pra depois
te abandonar
Aprendi a me virar sozinha
E se eu tô te dando linha é pra depois
te abandonar
Aprendi a me virar sozinha
E se eu tô te dando linha é pra depois
te abandonar
Aprendi a me virar sozinha
E se eu tô te dando linha é pra depois
te abandonar
Aprendi a me virar sozinha
E se eu tô te dando linha é pra depois
te abandonar
sexta-feira, 26 de junho de 2009
Isto sim é um evento
Russian Company To Offer Hunting Cruises In Somalia
Luxury yachts in Russia are offering pirate hunting cruises in the dangerous waters off the coast of Somalia with the hope of being attacked.
Passengers pay about $5,000 to patrol and can pay an extra $7.50 a day to receive an AK-47 machine gun for protection and about $10 for 100 rounds of ammo.
The yachts travel from Djibouti to Mombasa in Kenya and deliberately cruise close to the coast at a speed of about five nautical miles hoping to attract pirates.
quinta-feira, 25 de junho de 2009
"Deixaste-me de lágrima no olho"
Concordei. A maioria das pessoas pouco mais são que bichos egoístas, invejosos e assustados, quando não mesmo maus.
Se calhar o que há a fazer é ser igual a eles.
"Pois. Mas depois, qual é o sentido da vida?".
Não tem. A não ser aquele que encontrares, adicionado à sorte e à persistência para encontrar alguém que o partilhe connosco.
"Só que para ser inabalável, tens de te afastar dos outros, tornares-te egoísta e frio, e isso é algo que eu não queria".
O irónico é que fazendo isso, não se acaba mais preenchido, apenas mais indiferente. E a indiferença acaba por tornar tudo mais ou menos absurdo. O sentimento de estar vivo desaparece e isso, desconfio, ainda é pior que cair várias vezes com as desilusões que associadas a essas quedas. Se bem que o sentimento de protecção nos leve a evitar situações.
"É a tal espiral".
Da qual não há saída. Outra que não continuar a arriscar e tentar ser menos magoada.
"Porque todas as vezes que sou levada a crer que talvez estivesse enganada..."
É por isso que dói tanto. É por isso que é importante diminuir as expectativas.
" É do cara...."
Mas quanto mais penso no assunto, menos acho que esteja errado. Não consigo pensar que o importante é ser egoísta e mimado, só porque todos os outros o são.
"Mas esse é o mal. É por isso que te perguntava qual é o sentido da vida. tornarmo-nos iguais? Mas qual é o sentido de nos mantermos assim? Para levar porrada?"
Entendo. Mas o dilema é continuar a acreditar mesmo levando porrada, ou desistir e tornar-me indiferente.
"Essa é a minha dúvida. Fossilizo? Ou continuo a ter esperança?"
Não posso responder por ninguém. Eu acredito que vale a pena manter a esperança. Basta ver que ela sentia o mesmo que eu, logo, não estávamos sozinhos. E enquanto houver uma só pessoa que seja que me faça acreditar, vou manter a esperança que vale a entrega, a gratidão e a generosidade são fundamentais.
Porque a indiferença é pior. É morrer em vida. E eu não quero isso. Por mais que toda a gente à minha volta esteja morta, ou me queria matar, não me vou suicidar.
"Pois".
Prefiro arriscar a dor, porque se algum dia encontrar o que procuro, acredito que vou ser recompensado por tudo o que perdi ou sofri. Por isso é que continua a fazer sentido lutar todos os dias e encontrar pequenas coisas e situações que nos façam manter a crença, que algo de melhor haverá para mim, para nós, algures, por aí, e que se deixar de acreditar nisso, é que então nunca irei encontrar. E eu não quero fossilizar. Não tenho vocação para dinossauro.
Porque quando deixamos de acreditar, a dor deixa de fazer sentido e nada é pior que isso. Viver não é fácil.
"Viver é. Saber viver é que não."
Aproveitar o facto de se estar vivo e senti-lo. Se fossilizar, vou deixar de me sentir vivo e para mim isso é insuficiente. Preciso de mais do que simplesmente sobreviver.
"Obrigado pelas palavras animadoras. Deixaste-me de lágrima no olho".
Porque enquanto houver uma só pessoa, não estamos sós. E enquanto assim for, faz sentido continuar a acreditar.
quarta-feira, 24 de junho de 2009
Disseram-me para comprar isto
Aparentemente tem tudo a ver comigo.
"As ideias são como peixes.
Se quisermos capturar peixes pequenos, podemos ficar pelas águas pouco profundas. Mas, se quisermos capturar os peixes grandes, temos de ir mais fundo.
Nas águas profundas, os peixes são mais poderosos e mais puros. São enormes e abstractos. E são lindos."
terça-feira, 23 de junho de 2009
Não gosto de poesia
Irrita-me.
Não consigo escrever poesia.
Digo mesmo que nunca escrevi poema nenhum.
Não me preocupo com isso.
Nunca quis ser poeta.
Não gosto de poesia.
Irrita-me.
Recuso-me a lê-la.
Por mim os poetas podiam morrer todos à fome.
Óbvio que não de nada de pessoal.
A bem ver, não quero que morra ninguém.
Só que me irrita os tipos que escrevem sobre sentimentos que nunca fui capaz de sentir.
É por isso que não gosto de poesia.
Morre sempre alguém no fim.
Nem que seja eu.
A minha última criação
Não adianta de nada ter expectativas.
- Se calhar a minha vida mudou quando tu entraste nela.
Existe sempre aquele tipo de coisas que nos escapam à compreensão.
- Ou se calhar a minha vida mantém-se na mesma e eu é que mudei.
O pior são as desilusões. Nem adianta queixarmo-nos, pois aparece logo alguém a dizer que não devíamos era ter criado expectativas.
- Provavelmente fui eu que me resignei e aceitei a ideia de que nada adianta lutar.
Falam-me de maturidade. Maturidade, para mim, é quando uma coisa que é boa demais para acontecer, não acontece.
- Toda a gente fala em amar e deixar amar. E só de começar a falar assim, já sinto que algo está a mudar.
Só por ser impossível é que se transforma em boa demais. Não estou a queixar-me. Estou a constatar. Não tenho uma má vida.
- Deixei de acreditar que sou forte e lá aceito que existem outros melhores que eu.
Simplesmente, não era bem isto que estava à espera.
- Às vezes até parece que tenho de pedir desculpa a alguém, por gostar dela.
Iludi-me. Não sabia. Tento desiludir-me sempre, porque não acho possível deixar de o fazer.
- Não era bem isto que tinha em mente, mas serve. Se calhar até chega.
No dia em que deixar de o fazer, deixo de pensar no prazer, o que é o mesmo que dizer que deixo de pensar no que existe.
- Por mais que se tente, acaba-se sempre a cair no mesmo sítio. E as pessoas que lá estão são sempre as mesmas, que sofrem do mesmo que nós.
Mas é disso que se fala.
- A um tipo, só lhe resta gostar delas.
Sem pensar no que se gosta, já não há vontade ou sabedoria para se criar expectativas.
- Não estou com isto a dizer que é mau. Simplesmente estava á espera de mais que simplesmente isto.
Às tantas, é mesmo isso que é viver.
Lá estou eu a ser demasiado
Que nobres são as teorias da auto-salvação. A realidade é o que é e um grande homem pode morrer numa queda na cozinha. Acredita-se no destino, que para mim é um conceito horrível. Não me agrada a ideia de não controlar uma coisa da qual sou o agente, como é a minha vida. Porque o agente sofre na pele os constrangimentos da acção. A vida é uma ideia bela, mas irónica. Irónica, dizem, porque a sua compreensão só chega no momento do seu fim. Mas isso é o que dizem. Eu não sei nada disso. Ainda não cheguei lá.
segunda-feira, 22 de junho de 2009
A minha última criação
1 – O tipo gostava.
2 – De tudo o que ela dizia?
1 – Qualquer um gostaria.
2 – De ser convidado?
1 – Que alguém sentisse fascinação em conhecê-lo.
2 – Ah!, pois, já mo tinham dito.
1 – Ficar atordoado.
2 – Tipo objecto?
1 – Tipo pássaro.
2 – Ah!, mas não foi convidado?
1 – Assim por assim, não.
2 – Deve ser estranho ficar de lado.
1 – Ele amava-a. Passou-se.
2 – Para o outro lado?
1 – Foi uma vergonha.
2 – Mas caíu sozinho?
1 – Havia mais uns que não foram convidados para a festa.
2 – Mesmo depois dele lhe ter dito tudo a ela?
1 – Foi uma conversa de mudos.
2 – Houve carne, ao menos?
1 – Vegetarianos.
2 – Comiam ovos, portanto. E como ouviste dizer? Foste?
1 – Fui.
2 – Não pensaste sequer em dizer uma única palavra?
1 – Calei-me.
2 – Havia silêncio?
1 – Um tipo cantava, bêbado.
2 – Na água vem a vida!
1 – É um facto.
2 – E quem chorou?
1 – O tipo que estava a sangrar.
2 – Tudo para tentar vê-la?
1 – Não só vê-la, matá-la.
2 – E caiu numa armadilha.
1 – Foi ensaboado devagarinho.
2 – Só assim?
1 – Ficou sozinho, caído no chão da sala, com a cabeça aberta.
2 – Não ficou mais nenhum convidado?
1 – O verdadeiro amor espera, disse-lhe ele.
2 – Sonhava-se com chuva?
1 – Havia um que dizia que sonhava com o amor preso á pele.
2 – Não trouxeste dessa droga que ele tomou?
1 – É o que estás a fumar.
2 – Ah… E então ele apareceu?
1 – Falou.
2 – Ela respondeu...
1 – Disse-lhe sem lógica que tinha chegado o fim.
2 – E ele disparou.
1 – Cabeças.
2 – Só ficou ali a ouvir o que ninguém tinha a dizer.
1 – Era o fim da esperança.
2 – Mas não para ela!
1 – Sim. Falhou o tiro.
2 – Acertou no que sangrava?
1 – O pobre que acreditava no amor, foi morto por causa dele.
2 – Um amor que nem era o dele.
1 – Tinha chegado a hora do Orfeu, nada mais tinha a dizer.
2 – Foram nadar todos juntos, os que ficaram.
1 – Quando alguém os convidou a esquecerem os dois corpos.
2 – Não foi preciso convite?
1 – Não para os que estavam à espera de ser convidados.
2 – E quando vieram desataram aos tiros?
1 – Desfizeram-nos.
2 – E ela ficou sozinha?
1 – Chorou depois de cair o muro.
2 - Ele não tinha sido convidado.
1 – Eram tribos rivais.
2 – E ela era rival?
1 – Só até o ter descoberto.
2 – Mas de nada serviu. Todos morreram.
1 – Certo, certo, é que ninguém morreu afogado.
2 – Nem por excesso de brilho?
1 – Não. Era um mundo bonito.
2 – Com ambos a acharem-se especiais.
1 – Pelo menos, um para o outro.
2 – Não havia ali pertenças nenhumas?
1 – Não havia controlo.
2 – Ele dizia-se o sucesso de um corpo brilhante.
1 – Como ela se achava perfeita.
2 – Ignorou-se tudo.
1 – O tipo era um cretino.
2 – Ela não pertencia ali.
1 – Não havia mais nada a dizer.
2 – Ela chorou nessa noite.
1 – A morte é uma porcaria.
2 – Ele tinha um cabriolet.
1 – Carreira de sucesso.
2 – Mulher e um filho.
1 – Putanhices.
2 – Divórcio.
1 – Era bom na cama.
2 – Ela gostava.
1 - Ele gostava de muitos.
2 – Mas ele gostava era dela.
1 – Ele nem sabia.
2 – Nem queria saber.
1 – Até que os apanhou.
2 – Ela ardeu com outro.
1 – Não havia televisão.
2 – Nem jornais.
1 – Foi só foder.
2 – E houve um fim?
1 – Quando morreram.
2 – Cada um à sua maneira.
1 – Eram fascinantes.
2 – Cada um por si.
1 – Rezaram.
2 – Por algo puro e singelo.
1 – Para ele.
2 – Para ela.
1 – Quem ouvia voz dela quando falava.
2 – Nunca tinha sido adorada daquela forma.
1 – Sentiu dor por ele.
2 – Ela viveu.
1 – Houve sangue.
2 – E coisas que não se viram.
1 – Tu, eras como eu.
2 – Leva contigo a dor que eu sinto.
1 – Assim ninguém te vai adorar.
2 – Houve dores de cabeça.
1 – Acusações.
2 – Atentados.
1 – A cidade dividiu-se.
2 – Os gerentes comerciais deitaram fora as gravatas.
1 – Só os doentes escaparam.
2 – Como nós.
1 – Houve fraude.
2 – Ela morreu de fome na prisão.
1 – Qualquer coisa presa na garganta.
2 – Engasgou-se. Não podia comer.
1 – Ninguém lhe quis lavar a alma.
2 – Queimaram a igreja.
1 – Deixou de haver convites para quem quer que seja.
2 – A cidade morreu.
1 – Agora há só uma.
2 – Dividida em duas ilhas.
A minha última criação
1.
“ Tinha 21 anos a primeira vez que dormi com aquela mulher...ah!ah!ah!... Não tinha nada; estava a gozar! Ah! Ah!. Li isto em qualquer lado e achei piada! E como responsável pela recepção aos novos, achei que ficaria bem. Para vocês, sou o primeiro rosto do sistema. E o sistema satisfaz todas as vossas necessidades!”
Um dedo no ar.
“Sim?”
“Isso quer dizer que se não estiver coberta pelo sistema, a necessidade não existe?”
“Deixe-se de perguntas parvas. Você não está aqui para fazer perguntas, mas sim para trabalhar. Interrompeu-me. Agradecia que não voltasse a fazer isso. Perdi-me. Está a ver! E agora? Tu aí, ajuda-me. Que estava eu a dizer? Ah, sim, já me recordo. Estava a dizer-vos que, dado esta situação ser nova, mandam um tipo simpático, eu, para vos receber! E agora, para não perdermos mais tempo, façam o favor de se dirigirem aos respectivos balcões, a fim de procedermos ao registo. Sejam bem vindos ao mundo dos homenzinhos!”.
2.
Não sou imigrante. Juro que não, embora possa parecer. Para se ser imigrante, é preciso ter-se algum ponto de partida, e este é o meu ponto de partido. Ainda não percebi bem o que sou. Neste momento sinto-me como se tivesse sido expulso do paraíso pelo Adão, depois de ter andado a tentar comer a Eva. Mas não fui. Nem sequer conheço nenhuma Eva. Para falar verdade, olhando à volta, não vejo nenhuma com a delicadeza que imagino, que a Eva devia ter...
“Siga, siga, não empate o caminho. É a andar para a sua secção!”
“O Sr. Já viu isto? Descobri que o melhor que se pode fazer é comprar. Comprar é a única atitude decente a ter. Compre homem. Compre tudo, não interessa para quê! Se for o que tem mais, porque razão se há-de preocupar com a utilidade das coisas!!?”
Largue-me, que coisa? Mas quem é este tipo? Já me falaram de profetas e de loucos, mas não devo ter prestado muita atenção a essas aulas. Pelo menos, agora não me recordo de nada que me possa servir.
“Homens à direita, mulheres à esquerda, animais na ponta. NA PONTA!! NÃO OUVIU MINHA SENHORA! Quero lá saber se a tartaruga tem reumático! Os animais vão para a ponta e não se fala mais nisso.”
Oh! Não é preciso empurrar! Que raio de gente tão enfática, esta.
“Ó minha sebosa, estas coisas não são à borla! Um tipo tem de pagar aos artistas. Quais? Aqueles que andam ali à luta no ringue. Sim, eu sei que são ursos, mas os ursos custam dinheiro. O quê? Pouco me importam os direitos dos animais. Eu cá, cumpro-os. Veja que até salvei a vida aos pobres bichos. Trouxe-os do Pólo. A senhora já viu o frio que lá faz? Como está a ver, eu praticamente como que salvei a vida ao pobre bicho. Ninguém aguenta muito tempo aquele frio! E não há nada para se fazer. É totalmente desinteressante. E acredite que eu sei, já lá tive!”.
Disseram-me que tinha chegado a hora de cumprir a minha função. Não me explicaram bem foi que tipo de função era essa. Nem que iria ser empurrado por tipos vestidos de crepe, até umas mesas onde estão sentados uns tipos de preto. E agora, que é suposto dizer?
“Número.”
O quê?
“NÚMERO, não ouviu?”
- 1978, respondo.
- Secção de origem?
- Ocidental.
- O senhor está colocado no nível C. Siga para lá.
Sou empurrado por dois tipos vestidos de crepe que me arrastam de frente da mesa. Mas para onde é que me estão a levar?
- Ouve lá, assumir uma função não é a mesma coisa que coacção física. Mas que raio! Alguém me explica quem é aquele gajo e porque raio há-de ser ele a decidir para onde eu vou! Eu quero reclamar disto! E qual é mesmo o nome do seu colega?
“Existe sempre uma dose de pré-conhecimento adquirido. Utilize-o.”
Mas como, se não param de me empurrar!?
“Ah!? Bateste-me?!!”
Mandei-lhe um soco.
“Estás feito.”
Pelo sim pelo não, é melhor dar um passo atrás.
“Anda cá.”
- Não te irrites, não podes. És um dos rostos do sistema. Lembra-te que o sistema é amigo e eu recordo-me do teu número.
“Mete-te a andar antes que me arrependa.”
Já eu não me arrependo. Ele estava a merecê-las.
3.
Nova porta, nova secção. Nova gente, mais mesas, mais barulho. Aqui estão todos vestidos de verde. Chamam-me ali de uma mesa.
- O Sr. É?
- Secção C.
- Credenciais.
- Aqui.
Andei 20 anos a estudar. Entrego o diploma que confirma a minha história.
- O senhor então está habilitado ao mundo dos homenzinhos, certo?
- Não tenho bem a certeza...
- O senhor é uma condição. É o reverso do corpo, o lado imaterial, e aquilo que o une a todos os outros seres, pois cada um tem uma condição. Qual foi a nota do seu exame final?
- 12.
- Hum...estou a ver. Não é lá grande coisa.
- Foi o que se pode arranjar.
- O senhor tem consciência de porque razão está aqui?
- Não.
- Chegou a altura do senhor se unir a um corpo, lá em baixo, na Terra. O senhor estudou para funcionar como o elo de ligação entre o sistema e o corpo que habitar. E é perante nós que o senhor vai responder. Tem a certeza de que se lembra do que estudou?
- Tenho andado com alguns esquecimentos.
- Então veja lá se se deixa de esquecimentos. A sua função é da mais profunda importância. A condição é geral a todos os humanos, e só muda a circunstância concreta em que se revela. A avaliar pelo seu diploma, o senhor está habilitado à Secção C. Não é o mais complexo. Mas tenho-lhe a dizer que a sua Área é a Ocidental. E essa é a mais complexa. E foi para isso que o senhor andou a estudar. Se não entende o que lhe digo, então é porque não aproveitou com as lições que lhe proporcionámos. O senhor vai querer assumir isso?
- Não sei. Aqui parece tudo muito pouco disposto a ser contrariado... E para falar verdade, não tenho a certeza de ter compreendido bem o que afinal sou.
- O Senhor representa uma condição e vai exercer pressão sobre o corpo ao qual se vai unir, no sentido de o condicionar à sua condição, isto é, a si. E você, responde a nós, que lhe damos as instruções que o senhor precisa para desempenhar esse papel.
- Está então a dizer-me que não posso escolher o que quero ser?
- O senhor vai levantar problemas? Isso não é aceitável. O senhor vai representar a nossa capacidade de sujeitar um indivíduo á pressão do seu meio. Portanto, deixe-se de provocações e preocupe-se mas é com o sítio onde vai ser colocado. O seu Hangar é o 3. Vá para lá, que lá explicam-lhe qual vai ser a sua Subsecção.
- Mas...eu...eu ainda queria fazer outra pergunta.
- Ponha-se mas é a andar que me está a atrasar a fila.
Sigo. Aparece logo um tipo vestido de verde a indicar-me o caminho. Não disse uma só palavra. Mas pelo menos, não empurra. O que é estranho, é que não tem qualquer cheiro! Será que eu tenho algum? E sabor? Serei comestível? Serei palpável? Se calhar até posso metamorfosear-me.
- Ai não posso?!
Estou a ver que falei alto demais...
4.
Agora estou num corredor comprido. Lá ao fundo vejo umas escadas que sobem. Fim do corredor... escadas... Coliseu?
- Olá!
Quem é este agora?
- Bem vindo ao Hangar 3. Sou um dos teus condutores.
- És o responsável por isto?
- Antes fosse, antes fosse, mas não. Estou aqui para te ajudar. Para te explicar, que o importante é o caminho e não a sua natureza. Tudo é relativo, logo, nada é importante em absoluto. Por isso, só tens que aceitar a tua posição na engrenagem. É a tua verdade. E é tão sincera quanto a de qualquer outro. Lembra-te que não interessa conhecer tudo. Conhece bem somente aquilo que deves conhecer.
Que cretinice. Mas é melhor ficar calado.
- Para fazeres bem o que te compete, tens de ter segurança. Tens de acreditar em ti e nos valores. E é mais fácil acreditares, quando os outros à tua volta acreditam no mesmo. Faz todo o sentido integrares-te. E depois só tens de desempenhar a tua função, melhor que ninguém!
Aqui no mundo dos homenzinhos, todos sabemos que a integração é difícil. Tu tens sorte, pois estás num nível que te dá direito a teres um condutor. Há muitos que não têm nada disso. Ficam entregues a si mesmos. Mas o teu caso é diferente. Tu és da Secção C. E essa é uma das melhores. Temos um historial de desempenho a manter. Lembra-te disso. Não vais querer deixar ninguém mal, pois não?
Mas que coisa a desta gente, sempre com ameaças veladas. Devia era ter fugido enquanto havia tempo. Ao invés disso estou à beira de outro lance de escadas. Só que este desce.
- Boa sorte!
Desço aqui, é? Assim parece. Catacumbas? Sou claustrofóbico. Quer dizer: não é que me falte o ar, mas pelo menos acho sempre que me devia faltar.
- Desce, desce!
Outro!
- Desce. Vou levar-te até à tua zona de embarque.
- E tu vais dizer-me o quê?
- Não te vou dizer o mesmo que o meu colega te disse, se é isso que queres saber. O outro é o teu condutor pessoal. Eu conduzo várias condições, não uma só.
Bom. Como se não chegasse o prato principal, ainda tenha de comer a sobremesa.
- Mas não ligues muito ao teu condutor. Não te deixeis impressionar. Só vais fazer o que já muitos antes de ti fizeram, e se eles conseguiram, não há razão para tu não o seres capaz.
Este parece mais simpático. Mas aqui, é sempre de desconfiar.
5.
Ora bolas! Não estou nada preparado para isto! Não posso voltar atrás. Mas ainda tenho milhares de perguntas! E muito mais dúvidas quanto ao querer fazer o que me estão a mandar fazer. Não quero apanhar e nenhum veículo. Mas que raio de merda é esta coisa do mundo dos homenzinhos!!!
Elevador parou. Abre-se a porta.
“Saem umas calças azuis para a terceira mesa do canto!”.
Merda. Mas porque raio não fugi eu enquanto era tempo?
Sobrevivi mais uma vez
Quando estava mesmo a ficar outra vez sem dinheiro, eis que me salvei de morrer à fome com o reembolso do IRS.
Nada mau, para quem tal como eu, esta outra vez a viver em stand by.
À espera de um novo projecto de trabalho, de uma nova casa, de um novo filme.
A M. voltou. A S. vai hoje. A N. vai no mês que vem.
Vou outra vez ficar sozinho.
Felizmente a G. convidou-me para ir viver com ela.
Se calhar vou aceitar.
A minha última criação
Todos os dias, à mesma hora, repetia o ritual. Sentava-se no banco, no mesmo banco, onde o vira pela última vez, esperando até a noite se pôr.
"Somos aquilo que são as nossas memórias", explicava ele à mulher, sempre que esta se queixava daquela esperança fútil. "Podem tirar-me tudo, menos aquilo que trago dentro de mim". Todos eram presas das errâncias do mundo. Só aquilo que cada um gerava dentro de si, estava livre de toda a maldade que o pudesse apagar.
Os amigos avisavam-no. A mulher continuava a queixar.se, Mas para ele, isso não era um problema. Continuava a acreditar, apesar de não entender. Aliás, principalmente por não entender. "A atenção é o corpo da alma". E o Homem não fora feito para se sentir seguro. Por isso ele esperava, com a calma de quem aceita todas as dúvidas interiores.
Dissessem o que dissessem, a verdade é que não podia sair dali. Não. E se ele voltasse? Nunca se perdoaria se faltasse a esse reencontro. Tornara-se guardião da solidão do outro, à medida que aquelas conversas se foram sucedendo, todos os dias, à mesmo hora. Aquela amizade tinha-se tornado mais importante que qualquer outra coisa. Viver naquela esperança, era pensar que o futuro poderia vir a fazer sentido. Aquilo fragilizava-o, diziam-lhe os amigos. Mas para ele era exactamente o contrário. Graças àquela esperança, passara a ter uma presença real, numa vida outrora vazia. E mesmo que essa presença fosse um vulto ausente, ele continuaria a guardar um lugar, naquele banco, impedindo quem quer que fosse de se sentar nele. Não fosse ele aparecer...
"Torturas-te!", reclamava a mulher. Ele não respondia. Ela jamais entenderia o que era viver deliberadamente de ferida aberta. Naquele banco estavam todas as vidas que nunca tinha vivido. Estava o pormenor do mundo, que aprendera a ler com admiração. Estavam as subtis diferenças que mudavam cada memória, sempre que a ela voltava. No seu íntimo, tinha consciência que esse mundo recordado era inalcançável. Mas nem por isso menos possível. E por isso ele, todos os dias, à mesma hora, repetia o ritual.
domingo, 21 de junho de 2009
sexta-feira, 19 de junho de 2009
Conversa de Café
Pudera. Quando o faço os meus desabafos são minimizados, uma coisa pouco importante, que é resultado das minhas inseguranças. Quais, ainda estou para saber, pois nem sequer as consigo expor, uma vez que ela nem me deixa terminar as frases.
- Ouve, como é que tu podes saber o que eu ia dizer, se nem me deixas acabar.
- Já percebi o que é que vais dizer.
- Estou a desabafar; não te estou a pedir lições de moral.
- Se me estás a contar, tenho direito a dar a minha opinião.
Claro que sim. Mas quando o desabafo passou a ser dela, já este direito não foi extensível a
mim.
- Não tens que estar sempre a analisar tudo. Estou só a falar.
Já tentei isso.
- Não dizes nada? Não tens opinião?
Ter, tenho. Mas isso só é útil se for a que ela quer ouvir.
- É isso que tu achas?
- Ouvindo o que tu disseste sim.
- Então não percebeste nada.
- Lá por não concordar contigo, não quer dizer que não tenha percebido.
- Tu agarras-te demasiado às palavras.
- As palavras forma tuas.
- Sim, mas não precisas de as levar tão a sério.
O que a bem ver, até é verdade. Há coisas que não merecem a importância que lhes damos. O difícil é saber quais.
- Nem ligas ao que eu te digo!
- Bom; primeiro dizes-me que não devo dar tanta importância ao que dizes. Agora queixas-te do contrário.
- Isso é porque tu não me dás atenção. Porque se desses percebias a diferença.
- Como é que é suposto eu perceber a diferença, se as regras mudam sem uma lógica traçável?
- Lá estás tu a desconversar.
Sendo que, na verdade, estava a tentar fazer exactamente o oposto. Mas era escusado tentar compreender.
- Tu és básico.
Pelo menos por uma hora, que na hora seguinte posso já ter passado a complicado.
- Afinal sou básico ou complicado?
- És básico numas coisas. O que complicas são os teus defeitos.
E depois acha estranho que eu me mantenha calado e não fale de mim.
- Não precisas ficar assim. Não se pode dizer nada!
- Dizes o que tu quiseres.
- Pronto, lá está tu.
- A fazer o quê?
- A concordar comigo.
- Pensava que era isso que querias.
- Não sejas condescendente comigo.
- Não estou a ser condescendente.
- Estás sim. Só dizes isso para me deixar satisfeita.
- Mas não é isso que esperas de mim? Que te deixe satisfeita?
- Hoje estás impossível.
Impossível, porque percebi a futilidade da discussão.
- Sabes, a mim parece-me que na verdade o conteúdo desta discussão pouco interessa. Tu na verdade queres é falar, pouco importando o que se está a dizer.
- Ai é isso que tu pensas?
- Estás sempre a mudar de opinião? Como é que podes estar à espera que eu saiba o que é importante para ti?
- Deixa-me muito triste ver que é assim que tu olhas para a nossa relação.
Senti-me manipulado. Felizmente aprendi a não perder o sono com isto. Foi necessário. Caso contrário teria morrido à muitos anos de exaustão.
quarta-feira, 17 de junho de 2009
Hoje disseram-me que sou um tipo excessivo...
Não discordo nem concordo, mas nós temos sempre uma opinião diferente de nós próprios, daquela que os outros têm.
Suponho que haja razões para acharem isso e também compreendo que isso não é propriamente uma boa coisa, nem algo capaz de me tornar popular.
Se for a pensar, os elogios que me fazem podem resumir-se à minha seriedade. E isso, sei-o bem, não é a melhor das características. Mas explica porque razão me procuram quase sempre para pedir ajuda ou trabalho. Suponho que seja o universo onde as minhas qualidades mais se aplicam.
Todos temos defeitos e limitações e todos seremos eventualmente capazes de traçar a sua origem e encontrar razões para as mesmas. Mas acho que não tenho de o fazer. Sou como sou e resta-me lidar com as consequências e implicações disso, sem entrar em defesas argumentativas acerca de como a tristeza faz tanto parte da vida como a alegria, ou que comporto-me de acordo com o que sinto e que isso nunca é desprovido de razões.
Tudo isso é muito verdade, mas nada muda.
Portanto, talvez tenha razão a MI. quando diz que eu não tento ser feliz. Pelo menos aos olhos dela, que a felicidade, como já foi explicado, é sintetizável e não absoluta.
Resta aceitar o que sou ou mudar se não gostar, coisa que não tenho a certeza de conseguir fazer.
"A Felicidade exige valentia" by Fernando Pessoa
esqueço de que minha vida é a maior empresa do mundo, e posso evitar que ela
vá à falencia.
Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver apesar de todos os desafios,
incompreensões e periodos de crise. Ser feliz é deixar de ser vítima dos
problemas e se tornar um autor da própria história.
É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar um oasis no
recôndito da sua alma.
É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da Vida. Ser feliz é não ter
medo dos próprios sentimentos. É saber falar de si mesmo. É ter coragem para
ouvir um "não". É ter seguranca para receber uma crítica, mesmo que injusta.
Pedras no caminho?
Guardo todas, um dia vou construir um castelo..."
segunda-feira, 8 de junho de 2009
sexta-feira, 5 de junho de 2009
Uma amostra do que está para vir
Não tenho bem a certeza do que é o amor. Em parte,suponho, é um desejo apaixonado, invejoso e irresponsável, que responde à beleza ou à sedução, com afeição e preocupação.
Em parte, é uma força insofismável, que ao invés de depender do valor de outra pessoa, adiciona-lho.
Interrogo-me se é possível amar na ausência de razões, mas também acredito, que sendo o amor uma projecção, o valor original pouco interessa, uma vez que ele lhe é imputado, simplesmente por causa da posição que ocupa como amante.
Suponho que nunca consegui perceber se no amor, o outro é um instrumento ou um destino.
Por um lado, parece-me que, se amo, é porque acredito que o outro tem qualidades nas quais me reconheço, mas também sei, que muitas vezes, aquilo em que uma pessoa acredita, tem menos a ver com a circunstância, do que com as origens motivacionais.
Por outro lado, não posso definir o interesse de uma pessoa, se não for capaz de definir valor. Mas como o amor me torna vulnerável ao que acontece ao outro, transforma a minha percepção, o que acaba por conferir valor a essa pessoa, independentemente das qualidades dela. Dizer que algo tem valor objectivo é torná-la comparável, que é como quem diz, substituível. Mas não é o amor caracterizado pelo facto do ser amado ser insubstituível? Se assim é, então não pode estar baseado simplesmente no valor do outro, mas em qualquer outra coisa, que a coloca acima de qualquer comparação.
No entanto, também não sei se é possível amar alguém por si mesmo, dissociando-a das propriedades, mas sei que não é por tê-las, que passo a amar. Existem muitas pessoas com as mesmas qualidades e amo apenas uma e não todas, pelo que tem de existir uma razão superior à objectividade, embora não saiba responder qual.
Que resíduo invisível é esse, que propriedade desconhecida é essa que nos leva a amar uma determinada pessoa? Ou será que não passa de uma decisão à priori, que recorre à paixão como mecanismo para justificar a energia aplicada no envolvimento?
Há estudos que dizem que a decisão é tomada pelo cérebro e só depois percepcionada e consciencializada. Se assim for, é o nosso inconsciente que nos manipula, impelindo-nos para uma determinada pessoa, num certo espaço de tempo. E por ser inconsciente, eu não consigo entender com exactidão. Acredito que seja isso que leva as pessoas a retirarem conclusões à posteriori, sobre as razões que desconheciam na altura.
quarta-feira, 3 de junho de 2009
segunda-feira, 1 de junho de 2009
Barcelona
Um fim-de-semana, pouco mais, com 4 amigos.
Fomos ao Festival Primavera.
Um festival de música, variada e reconfortante.
Uns dias passados sem confusão nem artrites.
Cansado sim, mas satisfeito por dentro.
Felizmente há dias assim.