quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Uma conversa típica

E - Porra!, nunca acreditas em mim!
A - Não estou a dizer que não acredito em ti.
E - Só não aceitas!
A - Não estou a dizer que não aceito.
E - As coisas são o que são! Já está na altura de nos deixarmos de inocências.
A - Não discordo, só que...
E - Só que o quê?
A - Percebe que eu não sei bem...não estou habituada!
E - A quê? À sinceridade?
A - Talvez...
E - Lamento que te sintas constrangida. Confesso que sempre achei que já tinhas compreendido.
A - Não é o que disseste! É a forma como o disseste.
E -Só disse que adorava aparecer contigo em público!
A - Não foi só isso que disseste.
E - Ouve, é verdade. Não és a mais inteligente das mulheres que conheci mas adorava o teu corpo..
A - E não achas que isso não é razão para ficar chateada?
E - O teu corpo também é uma coisa tua.
A - Pelos vistos, não o suficiente.
E - Não fui eu que te deixei.
A - Não me deixaste outra oportunidade.
E - Nunca acreditaste que eu te amava.
A - Talvez porque tudo o que me deste a entender é que amavas o meu corpo, não eu.
E - Não. Quanto muito o que te disse é que em ti, preferia o teu corpo; é diferente!
A - Vai dar ao mesmo.
E - Não, não vai. O que eu disse foi que o teu corpo foi o que mais me impeliu para ti. E amar em parte é aprender a gostar.
A - Ou gostas ou não. Não adianta simular.
E - E tu, em algum momento chegaste a amar-me?
A - Claro que sim!!
E - Então o que te chateou mais? Amares um bruto, ou aquilo em que te tornaste por amares um?
A - Não é nada disso que eu estou a dizer.
E - Então não sei o que estás a dizer. Ouve, fiquei contigo por algo que era teu.
A - Não é isso que está em causa!
E - Bom, então nesta altura já não faço a mínima ideia do que está em causa.
A - O que está em causa e achares-me uma burra e mesmo assim estares comigo. Dizes-me que sou uma burra, mas que como sou uma burra bonita tu ficas comigo.
E - Onde é que nas minhas palavras estou a dizer que és uma burra?
A - Naquilo que me estás a chamar.
E - Que é?
A - Fútil. E se isso para ti chega, então não és o homem que eu pensava que eras.
E - Só depois de te conhecer posso amar-te pelo que és. Até lá só te posso amar pelo que pareces ser.
A - Mas não saíste dessa fase.
E - Não me deste tempo.
A - Não percebes como me sinto fragilizada ao ouvir-te dizer que o queres de mim é o meu corpo?
E - Não é só o corpo! Quantas vezes tenho de repetir!!? Continuo a gostar dos momentos que passava contigo. Sempre dei importância ao que tu fazias, sempre te observei, sempre te ouvi. Sempre dei importância ao que tu me dizias. Nunca me furtei a conversas.
A - Neste momento já acho que era só para me entreter.
E - Não te entendo: se te digo que não és a mulher mais brilhante que conheço, dizes-me que te estou a chamar de burra. Se eu digo que me apaixonei pelo teu corpo, criticas-me por me satisfazer com pouco. Se vamos continuar a jogar às acusações, acho melhor esta noite ficar por aqui.
A - Queres que eu me vá embora?
E - Não estou a meter-te na rua.
A - Estás só a insinuar que é melhor.
E - Estou a dizer o que sinto.
A - Se queres que te diga, até és capaz de ter razão. Não vale mesmo a pena continuar com esta discussão. Já acabou mesmo tudo entre nós, de vez, não acabou?
E - Queres que te diga o que sinto, ou queres que concorde contigo?
A - Às vezes acho que só queres é dar-me uma razão para te começar a odiar.
E - Às vezes sinto que preferia que isso acontecesse.
A - Eu preferia que nada disto tivesse acontecido.
E - Nem as partes boas?
A - Não; essas sim. As outras é que não.
E - Preferias o quê? Uma vida convencional?
A - Porquê? Parece-te assim tão mal?
E - As coisas tomaram o rumo que tomaram.
A - Porque tu nunca te entregaste, nunca foste capaz de te abrir comigo, de estares à vontade.
E - É portanto, uma incapacidade minha...
A - E não é?
E - Se tu o dizes.
A - Lá estás tu outra vez a ser cínico.
E - Lembras-te de quantos telefonemas teus recebi, a informares-me que estava tudo acabado entre nós, para no dia seguinte voltares a pedir desculpa?
A - Porque tu nunca percebeste que isso só acontecia porque eu te amava. Viver contigo é como viver com um furacão. Guardas as emoções até rebentar. Num momento estava tudo bem, no outro logo a seguir ficavas todo frio e distante.
E - Nunca te queixaste disso.
A - Não tinha de o fazer. É uma coisa suficientemente importante para teres de descobrir por ti mesmo.
E - Querias que eu subentendesse algo que nunca deste a entender.
A - É assim que eu entendo o amor: quando se gosta mesmo, tem-se sempre atenção. E tendo-se atenção, uma pessoa apercebe-se do que a outra quer. Se não fores capaz, então é porque não és a pessoa certa para estar comigo.
E - É. Se calhar não sou.
A - E nem dúvidas tens, sequer?
E - Tu tiveste-as?
A - Sempre gostei de ti. Continuo a gostar.
E - Já sei. Eu é que não correspondi o suficiente.
A - E não.
E - Sabes que podes cortar com o passado, mas que o passado não corta contigo.
A - Eu sei. Mas já me habituei à ideia de seres passado. Tu nunca conseguiste acreditar que eu te amava mesmo.
E - Fizeste muito pouco para mo dar a entender.
A - Bolas! Saí de casa do meu namorado, com quem vivia à 6 anos para ir viver contigo. Não te parece suficientemente expansivo?
E - Agora a esta distância, claro que sim, mas na altura...sempre foste tão frágil.
A - E tu nunca me soubeste proteger.
E - Ao contrário do que possas pensar, sempre tentei proteger-te. Apaixonei-me pela tua fragilidade.
A - Então porque é que nunca o disseste? Porque raio te calavas, não dizias o que querias!? Ainda hoje acho que tens imenso para dar, mas que estás à espera que aconteça sei lá eu o quê.
E - Se calhar ainda tenho receio de assumir alguns desafios.
A - Não entendo é porque numas coisas assumes logo os desafios e noutras desatas a fugir.
E - Fujo daquilo que conheço mal.
A - Tens medo de ti próprio é o que é. E não consegues perceber que é nisso do qual foges que está sentido. E tu foste capaz de fazer coisas tão bem feitas, tantas vezes; tinhas momentos de tal brilhantismo...e eu sempre me senti frustrada por comigo não seres tão dedicado...Cheguei a sentir inveja dos teus amigos; com eles tinhas uma felicidade que nunca consegui que tivesses comigo.
E - Também te pedi pouco.
A - Isso é o que tu pensas. Viver contigo é pedir muito.
E - Só que eu não peço.
A - És uma besta emocional, é o que és.
E - E tu és susceptível.
A - E tu ignoras os sentimentos dos outros, até daqueles que vivem contigo.
E - Sabes lá. Viveste comigo um ano, não a vida toda.
A - Tens medo de gostar das pessoas.
E - Segundo os teus parâmetros.
A - E orgulhaste disso?
E - Tu é que puxaste a conversa. Estou só a responder-te.
A - Estás a desculpar-te de algo?
E - Não vejo que erro possa agora ter cometido para me estar a desculpar.
A - Estás a dizer que eu fui um erro?
E - Estou a dizer precisamente o contrário.
A - Não te arrependes de não ter feito mais?
E - Talvez.
A - O importante é o antes, não o depois.
E - Tu lá sabes...
A - Lá estás tu a oferecer-me vitórias por condescendência.
E - Mais vale estas que nenhumas.
A - És um orgulhoso. E por causa desse ter orgulho é que nunca foste capaz de perceber que eu queria mas estava indecisa. Sabes o que isso significa?
E - Que não querias nem deixavas de querer.
A - Estás a ver!
E - O quê?
A - A forma como tu metes as coisas. Não quero ficar chateada contigo...
E - Não tens de ficar. Não deu. É tudo.
A - Mas eu queria que tivesse dado...
E - Mas não deu.
A - Nunca é estúpido deixares-te levar pelas emoções. É por causa de pensares que o é, é que nunca te permites fazê-lo.
E - Culpas-me por algo que revela que acima de somos de tudo incompatíveis.
A - Aceitarias-me de volta?
E - Não me vou dar a esse prazer.
A - Porquê?
E - Porque sei que não ficas.
A - Se me amasses, não dizias isso.
E - Prefiro recordar-te.
A - Já sou assim tão parte do teu passado?
E - Sabes que eu sempre vivi tudo muito rápido.
A - E para onde pensas agora dirigir essa tua rapidez?
E - Logo se vê. Sabes que eu nunca fui mesmo capaz de me comprometer como uma só coisa.
A - Foste feliz comigo?
E - Que importância pode ter isso agora?
A - Toda.

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